terça-feira, 26 de junho de 2018

História de Esperantinópolis: Moendas e Fusos


O Nome Esperantinópolis

“A incontrolável imigração destes últimos anos, determinadas pelas secas do Nordeste, aumentou consideravelmente a demografia desta zona do Mearim e levou     o Governo do Maranhão à constituição do novo Município de Boa Esperança,   trocado este nome pelo de Esperantinópolis e o de vila pelo de cidade”.

Metódio de Nembro, o.f.m.cap.
São José de Grajaú
primeira Prelazia do Maranhão






 A notícia de que éramos, não mais vila de Boa Esperança, mas Cidade, nos veio com a tranqüilidade do seu mensageiro, o então Gerente da firma Chames Aboud & Cia. Ltda. em Verdun, o nosso ilustre Osiel Miranda. Via telefone ele recebeu para todos nós o telegrama.
Que nos trouxe numa manhã do início do mês de maio de 1954.
Na oficina de sapataria de meu irmão Aluísio Carneiro Corrêa estavam uns dos seus clientes e amigos a bater papo e eu, que esperava o almoço que minha mãe Maria José Carneiro preparava para que o levasse à roça em início da colheita do arroz, Seu Osiel nos apareceu, vindo no trote de bons arreios de uma burrinha cardã, parou, por nos ver, e após as saudações dos bons-dias, sorrisos, convites a apear-se o cavaleiro, aí sim, ele nos passou a notícia:
“Boa Esperança do Mearim agora é cidade, passou a Cidade. O Governador Eugênio Barros, no dia 27 de abril último, assinou a lei da criação do Município com o nome de Esperantinópolis”.
Verdade?!
Verdade! E agora!... A gente parecia se perguntar, como quando algo muito sério acontece em conseqüência de uma brincadeira. Sério, sim! Cidade, sim!
E aí?! Cadê a rua, a praça, o prédio para a Prefeitura e a Câmara, onde a cadeia... De outros prédios, como para mais escolas, os correios, o hospital... Pois é verdade!
 Esperantinópolis, neste seu início de Município, não tinha uma aparência urbana, era uma estrada habitada.
E o nome!... Como o pronunciar?!
Seu Osielno-lo ensinou, soletrando mesmo. Dei-o, poucas horas após, como notícia a meu pai, Severino Corrêa, e aos trabalhadores que, com ele, colhiam o nosso arroz.
Como em sua lírica soberania, Ana Neris Góis nos diz que “O Bem unifica, totaliza”, o nome nos uniu numa soma em total confiança a nos dar a explicação do porque colhíamos o arroz, um nome, como o nome de Esperantinópolis a carregar a nós no cofo do trabalho que tece a história que “transcende, prevalece”, ainda nos diz a poetisa.


Como se formou o Município


A democracia, após 1945, não encontrou espaço em terras do interior do Maranhão. Os entusiasmos com a redemocratização foi o plantio sufocado pelo autoritarismo de uma política de governo a se reimplantar numa oligarquia de coronéis sob o comando do então Senador Victorino de Brito Freire. Apesar das resistências da população da capital São Luís, tornada na “ilha rebelde”, porém confinada dentro só dos limites da linda Upaon-Açu.
Eleições eram brincadeiras. Seus resultados, antecipadamente, anunciados. Candidato eleito, só dos ungidos do poder da oligarquia, porque com o voto de cabresto, com a fraude eleitoral, com a conivência do poder judiciário, era um jogo de cartas marcadas.
Assim era o Maranhão, quando o comerciante João Ângelo Batista, dono de vastas áreas de terras na região da margem direita do rio Mearim, partindo seus domínios do povoado Axixá, projetou-se como o autor da proposta da criação do Município com sede a ser criada na Vila de Boa Esperança.
Obteve, sim, o apoio do líder maior do Estado, o Senador Victorino Freire, após o que, o encaminhou à Assembleia Legislativa por meio do Deputado Jefferson Rodrigues Moreira, por ter este fortes ligações familiares e políticas com Barra do Corda. Barra do Corda sob a administração do Prefeito Manoel de Melo Milhomem que já se indispunha politicamente ao contrário do Deputado Jefferson Rodrigues Moreira, o que escreveu nosso nome de Esperantinópolis.
O Prefeito Manoel de Melo Milhomem não optou por prejudicar a tramitação do projeto do novo Município, porém determinou que o seu território se limitasse à margem esquerda do rio Mearim.
Na margem direita se desenvolvia uma questão fundiária entre João Ângelo Batista, o proprietário da terra, e o posseiro José Maria Martins Jorge, que contestava suas posses.
 Assim é que se desenhava uma luta de que surgiu o Município de Esperantinópolis, como uma alternativa, que daria ao seu autor, João Ângelo Batista, poderes a fazer as demarcações de suas terras, não mais sob a jurisdição de Barra do Corda, mas de um novo Município criado por influência direta de seu prestígio político.
Segundo ilustre jurista, filho adotivo do casal Joaquim Araújo Arruda e Dona Cotinha Sá Arruda, menino criado em Boa Esperança, formado jovem em Direito, Promotor Público da Comarca de Pedreiras, onde veio a falecer, Dr. Ary Sá, em um trabalho literário, “Província dos Coroneis” – 1965, afirma que o Maranhão se constituía, em sua época, uma soma de grandes latifúndios. Para isto havia a indústria do latifúndio que agia “da seguinte forma: o coronel caboclo adquire uma vasta área de terras através de usucapião ilegal, fabricado por alguns advogados, escrivães e juízes desonestos”.
E como o estado, nas mentalidades dos coronéis, só existia para lhes favorecer, as suas terras devolutas poderiam ser tomadas dos seus lavradores por ações de usucapião ilegais e tornadas propriedades por sentenças judiciais irrevogáveis, inquestionáveis pelos nós jurídicos dados e feitas escrituras do “para sempreamém”, isto que ouvi um dia um escrivão a dizer.
De João Ângelo Batista, porém, guardamos a memória com a gratidão pelo grande bem que nos proporcionou. Seu projeto nos concedeu a Cidade do nosso amor, da nossa vida, do nosso trabalho, da nossa esperança.


  

O Dia da Cidade

A comemoração do ser Cidade de Esperantinópolis, a alegria vestido de seda das senhoras, roupa nova das crianças, brilhantina coty em meus cabelos, terno e gravata dos senhores, com um porquê solene, foi o primeiro Dia da Cidade que ocorreu a 27 de junho de 1954.
Quando estava presente o Dr. Regino de Carvalho, Juiz de Direito da Comarca de Pedreiras, especialmente designado pelo Tribunal de Justiça do Estado, para, ao lado do Deputado Jefferson Rodrigues Moreira, presidir a sessão solene de instalação do Município de Esperantinópolis criado pela Lei Estadual nº 1.139, de 27 de abril de 1954. Lavrou a Ata o Escrivão João Pinto Neto, em que consta a posse do Prefeito Interino, nomeado por ato do Governador do Estado, o Senhor Antonio Leal Arraes.
O local onde se instalou a Prefeitura Municipal foi um prédio rústico, de um armazém, de propriedade do Prefeito Antonio Leal Arraes, cedido para o ato, e onde se fez a beleza de enfeites naturais com a matéria-prima do babaçu que se deu em palmas aos arcos, arranjos e o mais que a imaginação em artes pode compor.
Ouvi atento aos discursos proferidos. Palavras, gestos, gravando os vocábulos que a oratória produz, quantos novos, como efemérides, que esperei uns dias até que meu irmão Anísio Carneiro Corrêa conseguisse com seu padrinho Antonio Ribeiro Lopes um Dicionário onde a encontrei e que me falou tanto da minha vocação ao escrever, registrar os atos e fatos pelos quais se contariam a história de Esperantinópolis.
É que, até aqui, cem anos após o olhar de descoberta do nosso desbravador Cândido Mendes da Silva, há uma semente de vida da qual me sinto geneticamente ligado, deslumbrado, vocacionado. E, feliz! Muito feliz, quando as crianças, os jovens, os educadores a mim recorrem e eu lhes conto pontos desta história em que nascem todas as nossas fontes.
Pois, ao voltarmos da festa, tivemos uma tarde de muitas conversas e à noite foi o baile, no salão da escola, com música de sanfona, banjo, cavaquinho e uma rabeca do conjunto do sanfoneiro Raimundo Honório, a festa que uma noite fez para dizer-se o nome de Esperantinópolis, cidade-abraço-esperança. Difícil pronúncia para um povo analfabeto, mas aprendizado de amor a dizer e a se fazer e a se amar no dia seguinte ao da festa, do primeiro dia de trabalho da nova cidade.

  



Desafios

A maioridade, a liberdade, a cidadania são desafios. Nosso povoado tornou-se cidade, eis o desafio do poder ser, de se fazer, se formar, construir-se, ser por si mesma.
Faltava tudo. Recurso financeiro nenhum, só a boa vontade a procurar meios, inspiração, poder de fazer, por ganhar rosto, dizer-se presente com uma boa auto-estima no contexto político, social, econômico, cultural do conjunto dos Municípios Maranhenses.
Nossos líderes reuniram-se, escolheram onde construir a Cidade, sendo o lugar abençoado pelo Bispo Prelado de Grajaú, Dom Emiliano José Lonati, no dia 30 de julho de 1954, marcando assim o encerramento de santas missões pregadas com uma grande participação de fieis. Ainda neste mesmo ano, 25 de dezembro de 1954, Dom Emiliano José Lonati funda a Paróquia de Nossa Senhora do Rosário de Fátima em Esperantinópolis, nomeando pároco o capuchinho Frei Cosme de Borno que chegou a tomar posse da Paróquia no ano seguinte e acompanhado de Frei Raimundo Vale.
Houve as eleições municipais a 3 de outubro de 1954. O novo Prefeito Genésio Carvalho Serra, ao empossar-se com a primeira Câmara de Vereadores, empreendeu a custosa e difícil tarefa de fazer a cidade a se construir em um centro urbano. Graças à força atrativa da presença dos frades capuchinhos que demoliram a capela de Santa Teresinha e construíram uma outra igrejinha de taipa onde é hoje o Hospital Municipal Santa Marta, com os ofícios religiosos celebrados diariamente, também com o motor-de-luz que iluminava a Rua Sete de Setembro, então o centro da cidade, formando o quarteirão com as Ruas Claúdio Carneiro, Getúlio Vargas e Três de Agosto, então se formou um espírito de coletividade em mutirões que construía a igreja, abria estradas, transportava doentes, fazia o transporte de materiais e mercadorias do porto de Verdun, viu-se a força de um povo por querer-se a si mesmo em cidadania.
Os padres assumiram a educação, a assistência social, os serviços de saúde. A Prefeitura os apoiava, o povo participava, a cidade ganhou uma fisionomia religiosa. A vida social, civil, econômica se fez ao redor da igreja, em horários que o sino determinava, em condições que a catequese permitia.




Cinzas de Bagaceira

A economia do Município de Esperantinópolis, no ano de sua emancipação, já sentia o declínio da produção canavieira, a desativação de alguns engenhos, dada, um dos fatores que concorreram para isso, a concorrência de produtos nordestinos que, via rodoviária, chegavam com preços mais baixos e de melhor qualidade. O nosso açúcar mascavo foi logo deixado de lado, trocado pelo açúcar alvo, refinado, também nossa rapadura e a nossa boa cachaça, esta também encarecida em muito pelos impostos de que lhe cobrava o coletor Federal de Barra do Corda, inviabilizando a produção, visto que os nossos empreendedores não optaram por se estabelecerem com registros de empresas de indústria, de comércio. Na informalidade em que permaneciam, resolveram apagar o fogo dos alambiques, da bagaceira, a se inscreverem no fisco.
Via-se, então, o fim dos engenhos, os canaviais cedendo-se às soltas de gado que, por essa década dos anos de 1950, já se começava a criar para a produção local do leite e da carne, muito pouca ainda no açougue.
E os engenhos!... Das ruidosas madrugadas... Por que se acabaram... Antonio Calixto, ex-moedor, destilador, disse: “Porque os engenhos eram de pau.”
Verdade! Máquinas de vida verde, não chegaram à idade industrial do ferro e aço. Não deram os lucros devidos à formalização de engenhos-empresas a garantir movimentação contábil e fiscal característica de uma economia com possibilidades de permanência por um tempo bem maior. Tornaram-se cinzas do tempo.
O caminhão continuou a trazer-nos mais nordestinos, força de trabalho que optou pelas roças de arroz e mais o sonho fazenda de criação da vaca. Tomar terras, brigar, matar, morrer pela terra, grilar, por ser da terra donos, porque traziam consigo o som chocalho da vaca por perdidas campinas, vaca nordestina por ser também do Maranhão do Mearim, marca de confusos latifúndios.
Mas a nossa memória guardou o som moagem rangido que gerou a Cidade bem onde era o canavial do sertanejo de São Raimundo das Mangabeiras, Martinho Gregório Granjeiro, a Cidade de Esperantinópolis, num ano encruzilhada da história em que os restantes poucos engenhos morriam e se apagavam em cinzas os bagaços da última moagem.




A Economia do Arroz

A terra de Esperantinópolis tornou-se de grande produtividade de arroz que se somou ao algodão, o milho, o feijão a mandioca e mais do coco babaçu.
Era nossa riqueza a força de tantos homens e mulheres trabalhadores e trabalhadoras rurais a expandir o nosso território municipal integrante da fronteira agrícola em que se fazia a região do Médio Mearim.
Exportávamos todos os excessos do consumo, o que possibilitou aberturas de estradas, desenvolvimento do comércio e a instalação da primeira máquina de beneficiamento de arroz, trazida por Gustavo Furtado Leite que a transferiu, no final dos anos de 1950, para Orlando Ribeiro.
Ah! Sim! Aliviou-nos os braços da mão-de-pilão. A usina de pilar o arroz foi uma libertação do trabalho pesado a que, mais, as crianças e as mulheres faziam, o arroz pilado no pilão, de preferência às madrugadas. Tun-tun que se ouvia, coração-vida-obrigação do decomer de cada-dia.
As roças de arroz se expandiam, formavam povoações enquanto o plantio do algodão deixava de ser do interesse da economia. Porque a usina dos Aboud, de Verdun, por obsoleta estar a sua tecnologia de mecanismos de produção, e por mais não interessar o negócio do algodão no mercado interno maranhense, por fechamentos de fábricas de tecidos, e nem para exportação.
Ficamos só com o arroz e por termos ainda muitas terras sob as matas virgens e que ninguém se dava conta do mal que se fazia nas imensas derrubadas que os incêndios destruíam ano-após-ano. Mas era o arroz o nosso ouro.
Foi o arroz que deu cor e poder à economia de Esperantinópolis por se afirmar numa prosperidade que nos garantiu, como Município, a autonomia e, como cidade, a força para a nossa construção própria, com as marcas de nossas mãos de povo a se formar e a se garantir com a auto-estima de sermos sempre Cidade da Esperança.





Acontecimentos

27 de abril de 1954
  - O Governador Eugênio Barros sanciona a Lei nº1.139, de 27 de abril de 1954, que cria o Município de Esperantinópolis, desmembrado do de Barra do Corda.

27 de junho de 1954
  - Solene ato de instalação do Município de Esperantinópolis presidido pelo Juiz de Direito da Comarca de Pedreiras, Dr. Regino de Carvalho, e que deu posse ao Prefeito Interino Antonio Leal Arraes.

30 de julho de 1954
  - Solene procissão presidida pelo Bispo Dom Emiliano José Lonati, da Prelazia de Grajaú, que abençoou o local para a construção da Cidade de Esperantinópolis............na época compreendendo uma área de 9 quarteirões entre as atuais Rua Osiel Miranda, ao Leste, e 7 de Setembro, a Oeste; Vitorino Freire, ao Norte, e 3 de agosto, ao Sul.

03 de agosto de 1954
- Mutirão de líderes, à frente o Prefeito Antonio Arraes, demarcou as primeiras ruas onde havia de se construir o centro urbano de Esperantinópolis.

25 de dezembro de 1954
  - O Bispo Dom Emiliano José Lonati assina o Decreto de criação da Paróquia de Nossa Senhora do Rosário de Fátima com sede na Cidade de Esperantinópolis.

31 de janeiro de 1955
  - Posse do Prefeito Genésio Carvalho Serra e do Vice-Prefeito Benjamim Soares Paraibano
  - Posse da Câmara de Vereadores que elegeu seu primeiro Presidente o Vereador Cláudio Carneiro de Souza, sendo Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores eleitos na primeira eleição municipal realizada a 3 de outubro de 1954.

15 de agosto de 1955
  - Solene encerramento do primeiro Festejo da Padroeira, com procissão nas ruas recentemente abertas à espera de seus primeiros moradores.

02 de janeiro de 1956
  - Abertura da Escola Paroquial Pio XII, sob a docência da Professora Normalista Odila Feitosa, em prédio municipal cedido pelo Prefeito Genésio Carvalho Serra.


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