A Lancha e o Rio
“No trecho de São Luís a Barra do Corda,
nas retas e
curvas do Mearim.”
Galeno Edgar Brandes
Barra
do Corda
na
História do Maranhão
“Rio Mearim, se
alcanças as marés,(...)
Sou a cascata
pingente na serra,
Tu me ensinaste
o quanto somos água.”
Elizeu Lima Nascimento
Rio Mearim
O rio e o gemido lancha
ansiedade enche o vale de dor e gozo, poder humano, lancha Andorinha.
Rio entre o verde das
florestas e as histórias e o sertão a se chegar, vai a lancha subindo, subindo,
a um porto destino, linha de São Luís para Barra do Corda.
Traz a lancha o sal,
perfumes, tecidos, espelhos, livros...
A liberdade de ser sertanejo
paga caro por subir do mar pelo rio ao sol das serras de que manam os veios
correntes e unidos no Mearim.
Quantas cuias dágua! Da
necessidade da ocupação da terra que, no início do Século XX, carecia tanto de
sonhos e ousadias por subir-descer-unir oceano e sertão: Rio Mearim, possibilidade
porser vilas, cidades, povoados como Angelim, Desordem e para além de Pedreiras, São Luís
Gonzaga, Vitória, Arari e o grande orgasmo mar, ao mar-porto-capital.
Esperantinópolis estava
ainda por ser. Bago de um futuro amor a organizar o olhar encontro homem-terra
na aliança história-sementes de algodoais por se plantar.
Poder que um sonho atiça.
Quer ver!
E atravessa o rio. Bem no
povoado Angelim, risca as águas o remo, põe a canoa unida à terra da margem
esquerda do Mearim, no ano de 1910, o caçador Cândido Mendes da Silva.
Caçar? Mas também ver. A
curiosidade é o caminho das descobertas. E viu!
Águas límpidas,
liberdade-saúde a distanciar-se das infestadas noites de malária e terras,
terras para o plantio de algodão.
Enredou também a língua-lenda
com que retornou da solidão da mata a contar-se.
E o que a lancha Andorinha,
ao passar, levou a Barra do Corda, carta-história, do que vira o caçador, agora
vivo na fantasia do achado de águas-lagoa, flores, sol, lugar para onde ir,
para a noite e o dia e a vida e o amor em pés de algodão florar e ao mar enfim
se ir na lancha, de rede e de histórias a descer, a lancha Andorinha não mais
no rio, mas no céu mesmo como a voar.
Couro de Boi
Os caminhos do gado, vindos
do Nordeste e atravessando o rio Parnaíba, em terras do Maranhão, deram
povoações, cidades, Passagem Franca, Colinas,Tuntum... E, enfim, à margem do
rio Mearim, no seu curso médio, povoados de Axixá, Angelim, São Joaquim, caminhos
de antigos vaqueiros e seus descendentes não mais tangendo a vaca mas a
ouvir-lhe o chocalho saudoso e a calçar-lhes os pés com o couro de suas
alpercatas.
E com a vocação ousadia do
retirante, a ver, amar, possuir.
O rio Mearim, no final do
Século XIX, abria ao sertão maranhense entrada à economia da produção
algodoeira alimentadora do sonho empolgação de se fazer de São Luís do Maranhão
uma cidade industrial, ainda mais quando a abolição da escravatura tirou de
suas elites agrárias o trabalho servil. E a fabricação de tecidos estava à
frente dos empreendimentos.
Daí a necessidade de se
abrir mais roças e roças de algodão, utilizar os rios como vias de transporte,
implantar usinas de beneficiamento do algodão para que a produção da fibra
resultante do descaroçamento diminuísse o peso das sementes que ficariam para
novas plantações.
Então, a usina de Angelim,
da empresa barracordense Manoel José Salomão, ponto de onde nasceu o sonho a
ser minha cidade de Esperantinópolis.
E foi o Caçador Cândido Mendes
da Silva que o trouxe consigo. Alpercatas a deixar rastos de dança roda lagoa
onde um boi bebia. Ele viu! Um boi!
Cadê o laço? Só o bacamarte
com carga de pólvora e chumbo e a coragem. Mas não era uma onça, era um boi, o
couro bragado e fulgindo,
se ofuscando de seus olhos no sol da manhã.
Fugiu para dentro da imensa
mata. Deixou o rasto para os companheiros verem e historiarem, do que se deu,
se povoou o Centro do Boi, bem onde hoje é o bairro Laranjal da Cidade de
Esperantinópolis.
Este nome, Esperantinópolis,
chamar-se-ia a mais de quarenta anos depois, com brilhos de estrela, de
espelhos, de fitas, festa solidariedade por caminhos tantos, tantos terreiros
até a ventura de uma feliz cidade.
Cestos
Tornou-se mestre por guardar
o tesouro memória de nove décadas da história de Esperantinópolis, João Gomes
da Silva.
Desde os sete anos de idade,
em 1917, a ver e ajudar a tecer as fibras das ações pioneiras, com seu pai,
Abel Gomes da Silva, e, mais, com a esposa tecelã Teresa Gomes. Por toda a
vida. E a contar a quem o quisesse ouvir e por gostar de saber, tudo, em
detalhes, do que aconteceu ano, após ano, a envolver pessoas, marcar lugares,
ocasionar mudanças.
Sua casa e o tear de Dona
Teresa foi ponto de referência e de visitação, onde se encontravam memórias
artes, amizades tecidas em formas de cestos que o Seu João Gomes oferecia do
seu artesanato com palhas da palmeira babaçu.
Com simplicidade lavradora
fez sua vida uma casa de sua cidade. Cidade de quem tomou a mão e a acompanhou
por um século e a registrar de memória em contas tantas os contos, os casos, as
dores, as alegrias, as vitórias do seu povo a construir ruas, casas, bairros, aurbe que um poeta, que o ouvia,
se empolgou e lhe perguntou que nome outro daria à sua cidade? E acertando ser
“Terra de fulgente esperança”.
Bonito! Se leu Olavo Bilac...
Mas como, ao ajudar sua
amada Teresa no jogo do tear, como a tecer sonhos de um algodão mais que alvo
em luz, fios que se estendiam a formar as redes para o amor se gerar e a nascer
e sorrir com os rostos que sucessivas gerações haveriam de vir, e a oferecer-se
em escrita, leitura, foto, arte plástica, música, dança à coreografia dos dias e noites,
vidas, ao cantar dos hinos de nossas prosas e poesias.
Fusos
Coube à mulher a graça de
tomar os fusos e fiar o algodão das primeiras roças. Fusos da economia a tecer
a rede do aconchego-amor—centro da vida no Centro do Boi.
Mulheres agricultoras,
fiandeiras, tecelãs, cozinheiras a dar o sentido ponto ternura que sustentava a
luta do desbravamento pioneiro.
Daí porque o mais notável e
feliz a se registrar dos primeiros dez anos do povoamento que se constituiu
cidade de Esperantinópolis, foi a festa liberdade da terra, do trabalho, da
moradia-sonho-amor-dança-mutirão a construir casas, formar o povoado.
Terra-festa de todos, do
trabalho de todos, que as mãos da mulher tomava para o seu jardim.
A mãe parteira Maruzinha e a
Inez do Leocádio que me dava frutos de seu pé de tamarina, onde ela achou lugar que, me dizia, eu
menino atencioso a ouvi-la, onde uma onça fazia medo a ela todas as noites, daí
porque fazia uma fogueira que espantava o tudo de medos que a noite tem. E uma
rosa, roseira de Maria Rosa que trouxe rezas para os alívios das dores, sem
esquecer a mulher da vida e do amor que rezava, em tempos de jejuns, a devoção
da Invenção da Santa Cruz.
A beleza então se viu na
povoação com os registros primeiros da história que se escrevia, cartas a dar
notícias e a fazer mais chamados a quem se dispunha a vir e ver o que de graça
tinha a terra, o céu e as mulheres a fiar em mutirões.
As mulheres! Ninguém ficava
do lado de fora. Era a vida educação das lições para se levantar a casa, abrir
o poço, fazer a estrada, torrar a farinha de mandioca, tudo com a graça da
solidariedade, da presença feminina a oferecer o almoço, descanso, convivência
e as conversações que ajuntavam conhecimento, ternura, esperança resultando sempre num batuque,
num requebro de beleza dança em roda. E os fusos faziam o resto do algodão-erosque tecia a rede, a
canção, a história, de como se diz, de amor, história de amor.
Acontecimentos do Período
Agosto de 1910
- Sendo Governador do Estado
do Maranhão Luiz Domingues e José Leonil da Cunha Nava, Administrador Municipal
de Barra do Corda, o barracordense Cândido Mendes da Silva e seus companheiros
Aristides Vieira, Manoel Cardoso, Pedro Lopes, José Pinto e Eloy Pinto iniciam
a povoação que se denominou inicialmente de Centro do Boi, que deu origem à
cidade de Esperantinópolis.
Julho de 1917
- Chega ao povoado Centro do
Boi o lavrador Abel Gomes da Silva, primo de Cândido Mendes da Silva, que
trouxe nomeação de Sub-Delegado, cargo que exerceu mais como conselheiro, que
de Delegado.
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